- O que me trouxe aqui, foi a aventura, e talvez outros motivos que não posso revelar abertamente. (talvez isso fosse um aviso para iniciar uma comunicação não-verbal.)

Agora ela via claramente os jovens vampiros, principalmente as jovens, transformadas na linda fase de uma juventude, como ela. Mas em seu tempo, com 23 anos, já era uma idade considerável para uma moça.

Com essa idade, muitas já estavam casadas, a muito tempo. Mas isso não era para ela, que teve de acompanhar os casamentos de suas irmãs e também de seus irmãos. Entretanto, enquanto eles partiam para essa precária aventura de casar, ela ficava com a casa só para si, fazia dela seu reino, sua vida, entre os livros, cavalgadas e as espadas... Como sentia falta das espadas, dos combates simulados com seu pai.
Mas isso tinha sido a muito, muito tempo. Em uma outra vida.

Tantas vidas... Ela já havia sido Miranda, a mortal que vivia com seu alegre pai, assim como era Alexandra, a vampira completamente tirana em seus dominios, Julianna a viajante... entre tantos outros nomes que escolheu... e claro, os pseudonimos. Até que virou Foxy aquela que vive sobre as luzes animadas da Europa.

- Me digam companheiros, qual a nossa missão?
-Vamos em busca de justiça para essa fascinante criatura chamada Ariane?

- Como Foxy chegou, acabei não respondendo sua pergunta, Jaja. A cidade onde ficava o castelo em que eu morava, e que Carlo com frequência visitava, ficava em Aigues-Mortes, há alguns quilômetros de Arles. Então todos concordamos com Ariane em partir amanhã a noite? - Disse Lafayette, mal podendo conter sua ansiedade.

Gabrielle olhava com profunda indiferença externa a cena. Era especialista em manter-se fria e passiva em qualquer ocasião, para que pudesse decidir o que realmente fazer sem que os outros percebessem o que se passava em sua mente.

Ouviu atentamente o relato de todas aquelas vampiras ali presentes, e na verdade, estava tentada a juntar-se a elas. Percebeu o olhar da vampira Ariane sobre si, e então, acabou decidindo-se.

Mandou um sinal mental a ela indicando que iria. Logo via que teria que começar a se comunicar de forma oral, mas resolveu transmitir esse recado por pensamento mesmo.

Ariane recebeu o recado de Gabrielle e não pode conter um sorriso.
Virou-se então, para observar todos ali reunidos. Captou os pensamentos de Foxy, assistindo às memórias de seu passado. Todos eles eram tão interessantes! Será que pessoas comuns nunca eram transformadas? Bem, talvez não. Ariane podia imaginar bem o quanto um mortal teria que lhe chamar a atenção para que ela o concedesse o Dom das Trevas.
Olhou para Lafayette, para Foxy e para Jaja. Procurou com os olhos por Ágatha, num inútil ato humano, já que já não sentia sua presença no Cabaret. Achou que deveria esperar por ela, afinal, não era só sua vingança. Mas ao mesmo tempo, não poderia arriscar que os vampiros ali mudassem de idéia, como não poderia obrigar Lafayette a esperar por uma vampira que ela nem sequer conhecia.
Ela continuou a olhar para eles enquanto esperava a confirmação de todos sobre a partida na noite seguinte.

- Estou. - disse Gabrielle de forma seca, sentindo seu esquecido sotaque frances sair nessa simples frase.

Estava animada com a perspectiva da aventura, mas não é por isso que deixaria sua máscara fria de lado.

- Sim, devemos esperar por ela. E talvez uma saída tão repentina fosse um pouco precipitado da nossa parte. - Concordou Lafayette, agora mais calma, que apesar de não conhecer toda a história da vampira de que falavam, sabia que deveria ser alguém importante. - Agora se me dão licença, vou procurar um lugar para passar o dia, pois já está amanhecendo. Nos vemos amanhã.

A vampira deixou o cabaré em direção ao céu ainda escuro, porém o ar já começava a apresentar o frescor da manhã. Fora na noite passada que havia chego à cidade, sendo atraída por algo naquela região.

Foi naquela mesma noite que acabou passando nos arredores do Cabaré e sentiu a presença não hostil de outros como ela e, sem pensar, adentrou o lugar. A primeira visão do local a deixou atordoada, e os poucos minutos que passou lá dentro foram suficientes para invadir a sua mente com doces recordações de sua vida mortal: a música contagiante, os vestidos esvoaçantes das belas dançarinas, a fina decoração, o cheiro de bebida... Coisas que amava e que foram abruptamente tiradas dela. Como sentia falta daqueles tempos, quando era a estrela do cabaré onde vivia e trabalhava.

Mas não permitiu o seu devaneio por muito tempo e logo voltou para a rua escura, aquelas memórias não lhe faziam bem. Esta noite, porém, o desejo de estar com outros vampiros e a vontade de se dar ao luxo de uma última dança foram mais fortes que a sua melancolia.

Ariane observou enquanto Lafayette se afastava. Suspirou. Queria muito que tudo acontecesse logo! Mas sabia que não era hora para impulsos, e com certeza não era a única a pensar assim. Todos ali, provavelmente, já tinham visto ou vivenciado consequências ruins de atos precipitados. E todos amavam demais a vida noturna para arriscá-la — mesmo que não soubessem disso.
Ariane relaxou na cadeira. Iria ficar por mais alguns minutos. Gostava de ir deitar-se somente no limite do tempo que tinha, como Monsieur de Liouncourt fazia.
Então ocorreu-lhe que, ao criar um grupo para a vingança contra Carlo, nenhum deles estava mais em segurança. Na verdade, nem os novatos no Cabaret, que talvez não participassem, mas que ouviram tudo; seria fácil extrair informações dos pensamentos deles.
Mon Dieu, ela pensou, que nenhum aliado de Carlo nos ouça agora.

Ariane foi a segunda a chegar de volta ao Cabaret na noite seguinte. Sorriu para Jaja enquanto caminhava para o mesmo lugar que ocupara na noite anterior, ao lado da mesa do vampiro. Ele sorriu de volta, cumprimentando-a.
Sentiu logo as preocupações na mente de Jaja; ela mesma já as tinha há um tempo. Depois de alguns segundos, somente porque não seria educado ir direto ao assunto, ela disse:
— Bem, não podemos saber quando, ou se, ela voltará. Em pouco tempo, Lafayette, Foxy e Gabrielle, talvez, voltarão. E é realmente possível que Agatha esteja atrás de toda a diversão sozinha — deu um meio sorriso. — Vendo por esse lado, se nós fossemos atrás de Carlo, poderíamos estar ajudando-a, não? Assim Ágatha não estaria sozinha...
Ariane deixou as reticências no ar, esperando por um resposta de Jaja e pela chegada dos outros.

Gabrielle foi a terceira ao retornar ao Cabaré. Viu Jajá e Ariane a distância, e aproximou-se sem ser notada. Podia ler neles as preocupações com a vampira Ágatha; na verdade ela não as sentia, mas sem ela, sabia que não teria a aventura.

- Boa noite - disse a vampira ao sentar.

Lafayette foi a última a chegar. Entrou no cabaré e viu que todos já se encontravam sentados a mesa. Jaja, Ariane e Gabrielle juntos, e Foxy em uma mesa mais afastada.
Esta noite estava usando um sobretudo, calça jeans e um chapéu, tudo pego de sua ultima vítima. Como uma das dançarinas estava sumida desde a noite anterior, a vampira certamente levantaria suspeitas e esta noite queria passar despercebida.
Passou pela mesa de Foxy e se perguntou por que ela não estava com outros. Não quis fazer perguntas, então apenas a cumprimentou e seguiu para a outra mesa. Exceto por Gabrielle, todos pareciam um tanto quanto preocupados.
- Boa noite, meus caros vampiros. Perdi alguma coisa? - Disse, sentando-se na cadeira a sua frente.

Ariane olhou para Lafayette e abriu sua mente à ela, deixando-a que visse o que a preocupava. Logo Lafayette entendeu que aqueles pensamentos eram os mesmos de todos os vampiros, ou quase todos.
Ariane olhou para Foxy, mais afastada, e chamou-a mentalmente para mais perto; o convite que esperava. E Ariane também adorava o som dos saltos no chão duro.

- Ágatha é uma peça chave em nossa jornada, mas creio que esperar não é a solução. Quem sabe ela não mude de ideia e nos ache no caminho.

Ariane olhou chocada para a mortal em sua frente e então abriu um pequeno e discreto sorriso. Aquela mulher lhe dava um perfil de mortal que ela já conhecia... Obviamente não queria o Dom das Trevas, tinha uma habilidade boa de leitura de mentes, para ter ouvido os pensamentos de Jaja, e dizia querer ajudá-los. Sim, Ariane já havia conhecido esse tipo de mortal. Mas ainda não arriscaria conjecturas. Havia fechado sua mente assim que percebeu que a mulher podia ouví-la; assim, a humana não saberia quais eram suas suposições.
— Esse perigo é muito urgente — perguntou Ariane delicadamente. — ou pode esperar uma apresentação?

Ariane olhou Jaja com o canto do olho e sorriu enquanto esperava resposta da mulher. Sim, haviam pensado o mesmo. Com certeza todos os outros vampiros também.
Talamasca. É claro.

Lafayette também fechou sua mente, surpresa com a intromissão da mortal. Já havia ouvido falar na Talamasca, mas nunca tinha tido contato com ninguém da organização antes. Achou a moça impertinente por falar com eles de maneira tão confiante. E, afinal, o que poderia uma simples mortal saber sobre o que é perigoso para um vampiro?

- E o que a faz pensar que pode nos ajudar? - Falou finalmente, de maneira um tanto sarcástica.